Diz a lenda que, antes de nascer, temos que entrar numa fila para escolher nossas caraterísticas terrenas segundo a lista de atributos divinos disponíveis lá no céu. 

Tem fila pra tudo: beleza, riqueza, inteligência, barriga tanquinho. Só coisa boa, claro. E alguém enfrenta fila pra coisa ruim?

Eu já me imagino lá. Em primeiro lugar tentando organizar tudo: “genteeeeeeeee, vamos fazer umas linhas paralelas umas às outras, pegar senha, cadastrar seus desejos no sistema pra saber se estão acessíveis, fazer reunião pra discutirmos estratégias.”

Depois que pensasse no grupo, na comunidade – e nas necessidades do povo como um todo – ia pensar em mim.

Se eu faço uma autoanálise agora, não tenho certeza de todos os atributos que eu requisitei, mas sei pelo menos um que passei longe: paciência (a fila devia estar grande).

Pa.ci.ên.ci.a. Não tenho nenhuma. Mais velha ainda estou pior!

Exemplo? 

Não tenho paciência pra enrolação. Adoro objetividade. Gente que vai direto ao ponto. Não é que eu surte, jogue a toalha, saia batendo porta. Pior. Eu faço aquele olhar pra cima – ou então balanço a cabeça em sinal de ansiedade – ou então apresso o coitado pra ser mais prático e agir.

Também não tenho paciência pra frescura. Detesto mimimi. Pessoa que se faz de vítima por tudo, saca?

Paciência pra esperar, não tenho! Quero tudo pra ontem. E intenso, nada de coisa morna.

Mais um? Não tenho paciência pra ignorância. E não tô falando de falta de estudo ou de oportunidade de vida. Tô falando de gente que tem tudo e é alienada e preconceituosa. Burrice de vida mesmo.

Nos tempos atuais, fui adquirindo umas “falta de paciência” novas. Não tenho paciência pra vídeos de autoajuda, de lavagem cerebral ou excesso de bom dia, boa tarde e boa noite no wazap. 

E gente chata: que se acha dona da verdade, que dá lição de moral, que reclama de qualquer coisa. Gente chata cansa!

Paciência não tenho, fato, mas entrei na fila pra ter bunda – várias vezes!

Kátia Galvão em 50etcetera